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A ARTE DE ESCREVER

  • Foto do escritor: Lilian Rocha
    Lilian Rocha
  • 17 de nov. de 2017
  • 3 min de leitura

Comecei hoje o dia recebendo parabéns e fiquei matutando: parabéns de quê? Afinal, hoje não é meu aniversário nem dia do professor. Nem tampouco dia da mulher, das mães ou qualquer outro dia que normalmente as pessoas me cumprimentam. Para minha surpresa, descobri que estava sendo parabenizada pelo "dia do escritor"! Depois da surpresa, veio a alegria, muito embora contida, pois o peso desse nome é muito grande e eu não me acho digna de estar na mesma categoria que os grandes mestres dessa área. Não possuo técnica, apenas escrevo com o coração e muitas das vezes com a imaginação, nada mais que isso. Mas devo confessar que fiquei feliz...

Escrever sempre fez parte da minha vida. Sou filha de um escritor, Petrônio Gomes, e dele herdei a paixão pelas palavras. Passei toda a minha adolescência escrevendo cartas. Tinha uma prima em Salvador com quem me comunicava todos os dias. Tudo o que acontecia na minha vida - ou seja, quase nada, pois nessa idade quase nada acontece - era contado pra ela, com os mínimos detalhes. E como o assunto era quase nada, eu preenchia a carta com minhas análises, sentimentos, sonhos, desejos e não sei mais o quê... Por conta disso, minhas cartas normalmente tinham 20, 30 páginas... Eram tão volumosas que eu tinha que dividi-las em 3 ou 4 pedaços, cada um num envelope, devidamente numerado. E depois de voltar do correio, eu me sentava no portão de minha casa pra esperar a pessoa mais querida do mundo pra mim, naquela época: o carteiro. Quando eu via aquele pontinho amarelo surgindo no horizonte, meu coração disparava! Quase todos os dias eu recebia carta, geralmente mais de uma. Nossa correspondência era tão intensa, que o carteiro dela era ansioso pra me conhecer!

Talvez por causa desse hábito de escrever cartas eu passei a me expressar melhor escrevendo. Se eu queria dar algum recado, se queria expressar uma alegria ou descontentamento, eu escrevia. Tudo era por escrito. Até pra terminar um namoro, certa vez, escrevi uma carta e entreguei ao meu namorado que a leu ao meu lado. Jamais teria sido capaz de dizer tudo aquilo com a mesma suavidade que o fiz escrevendo...

Com isso, fui descobrindo o poder mágico das palavras e me apaixonando cada vez mais por elas. Através das palavras, fui conseguindo conjugar os verbos mais difíceis: explicar, convencer, conquistar, emocionar, reconciliar, esclarecer, perdoar e algumas vezes até desmascarar alguém...

E de tão apaixonada pelas palavras, comecei a brincar com elas, dando forma às coisas que habitavam a minha imaginação. Dei voz a peças de roupa, a objetos da mesa, a termos da gramática, a personagens inventados... Através das palavras, ultrapassei os muros da escola onde trabalhava, ganhei um prêmio de Literatura e me tornei "escritora". Tudo por acaso. Como um sonho que a gente acalenta em silêncio, achando que ele nunca vai se realizar...

Acho que é exatamente esse o ofício de um escritor. Um sonho silencioso, uma tarefa solitária. Não é algo que podemos fazer "com alguém", apenas "para alguém". É muito mais "dar" do que "receber". E para que essa doação seja plena, precisamos estar completamente sós, para sermos capazes de escutar aquela voz interior que sussurra aos nossos ouvidos, quase clamando para que lhe demos à luz... Em seguida, vesti-la com as palavras mais lindas, para que elas partam como flechas, velozes e certeiras, rumo ao coração de algum leitor, desconhecido e desatento, onde poderão ser, finalmente, fecundadas...

Assim eu quereria ser lembrada. Como uma "fecundadora de emoções"...

(Lilian Rocha - 25.07.16)


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