A ÚLTIMA DA FILA
- Lilian Rocha
- 17 de nov. de 2017
- 2 min de leitura
Se me fosse possível imitar uma das virtudes de minha mãe, eu escolheria, em meio a tantas, a que eu gosto mais: a virtude de passar despercebida.
Levamos a vida toda querendo fazer algo de grandioso, algo que nos eleve perante outros. Cultivamos o orgulho e a vaidade de assinarmos, ao final de cada obra, a fim de que nosso nome se imortalize na memória de todos e nos esquecemos, no entanto, de que, se quisermos ser os maiores, é no último lugar que devemos nos colocar, pois este ninguém nos pode arrebatar.
Nem sempre essa virtude é bem compreendida entre a humanidade. Quase todos nós a confundimos, constantemente, com um aniquilamento total da personalidade. Afinal, se sabemos que somos bons em alguma coisa, por que haveria razão de não querermos exibir nossas virtudes? Seria certo deixarmos de fazer o que somos capazes, só para não aparecermos diante dos outros?
Entretanto, a humildade não consiste em se esconder para não fazer nada, mas em não ficar se admirando, depois de ter feito o máximo. Não se pode ser, ao mesmo tempo, espectador e ator. O bom artista está todo inteiro em sua obra, mas apaga-se diante dela, para que todos a vejam.
Minha mãe sempre foi assim: uma artífice da humildade, virtude que soube cultivar, como ninguém, ao longo dos seus 86 anos. Quem a vê, imagina-a frágil, calma, incapaz de agir ou reagir diante da vida. Mas nós, que a conhecemos tão bem, sabemos que essa fragilidade se transforma em valentia quando lhe é dado o momento de agir.
Foram várias as provas de coragem que minha mãe nos deu, ao longo de todos esses anos, principalmente diante da morte. Quando tudo parece silenciar, eis que sua voz se faz ouvir, entoando canções a Deus, que nos agasalham o coração e nos enchem de paz. Sim, é CANTANDO que ela se despede dos que ama. E foi também cantando que nós a vimos dizer adeus a seu primeiro filho, Ricardo. Naquele triste dia de setembro de 2006, eu tive a prova definitiva de que ela não era de verdade...
Incansável no ato de servir, ninguém lhe deve ter escutado um ‘não’. E é com mansidão que ela ainda continua nos ensinando a não temer a vida, a enfrentar com dignidade o que porventura nos for colocado na frente. “Os problemas da gente, minha filha, são sempre menores que os dos outros, basta que não olhemos demasiadamente para nós mesmos” - diz ela. E esquecendo-se de si mesma, foi passando despercebida pela vida, deixando para os outros os aplausos e as homenagens.
Parabéns, mãe, pelas tantas lições de vida, de coragem, de fé, de sabedoria e de humildade que você nos ensinou. Infelizmente somos obrigados a confessar que por mais que tentemos, jamais conseguiremos imitar o seu exemplo.
Cansamos de vê-la na última fila, a se doar inteiramente por nós. Hoje a festa é sua e são mais que merecidos todos os aplausos e homenagens de hoje. Porque pra gente, você sempre vai estar na primeira fila, ocupando o primeiro lugar dos nossos corações... Feliz aniversário!
(Lilian Rocha - 09.05.14)

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