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COMO POR EXEMPLO... ELE!

  • Foto do escritor: Lilian Rocha
    Lilian Rocha
  • 17 de nov. de 2017
  • 4 min de leitura

A primeira vez que eu o “vi” foi em 1977, num comercial de TV sobre a “Golden Cross”, um dos melhores planos de saúde dessa época. Não me lembro de detalhes, lembro-me apenas que o comercial mostrava alguns homens conversando sobre saúde e, no final, um deles aparecia em close, colocando uma touca verde e dizendo: “...o melhor médico do mundo. Como por exemplo, eu!”

Neste exato momento, ele sorria e amarrava a máscara verde de cirurgião por detrás da cabeça. E só aí é que a gente entendia que aquele homem era, na verdade, um cirurgião que estava se aprontando pra entrar numa cirurgia. Não me lembro quem fazia o papel do médico, mas me lembro que eu achava lindo o tal médico e, por isso, sempre que passava o comercial na televisão, eu corria pra ver.

Por esse tempo, eu andava às voltas com ortopedistas, tentando encontrar uma solução para o meu joelho que depois de uma torção, ficou meio ‘frouxo’. De repente, quando eu estava andando, alguma coisa meio mole e redonda saía de dentro do meu joelho e ia parar perto da rótula, provocando um travamento na minha articulação. Era hora, então, de me abaixar e, com o dedo, reconduzir a tal “bolinha” para o lugar de onde ela tinha, supostamente, escapado.

Durante alguns anos convivi em paz com a minha “bolinha”. Ela passou a ser, realmente, uma parte de mim. Para tentar entender o que era aquela estranha bolinha, visitei vários médicos e tirei centenas de radiografias, pois não havia chegado ainda exames mais certeiros, como a tomografia ou a ressonância magnética . O primeiro médico disse que era menisco e já queria operar na semana seguinte. Fugi dele. O segundo era de Salvador e disse que era um ligamento que havia rompido. Para tanto, bastava fazer fisioterapia que, nesse tempo consistia apenas em forno de bier, umas massagens e alguns minutos levantando um saquinho de areia pra fortalecer o músculo da coxa. Mas minha bolinha não tomou jeito; continuou saindo do lugar e me deixando cada vez mais preocupada.

Em 77, decidi consultar outro médico, dessa vez em Niterói. Foi aí que ouvi, pela primeira vez, um diagnóstico diferente. Aquilo eram “fragmentos” de cartilagem que tinham se calcificado e virado um corpo estranho. E como todo corpo estranho, ele tinha que sair dali. Em outras palavras, era um problema cirúrgico! Para tirar a dúvida, fui a outro médico, dessa vez no Rio. Ele deu outra explicação, mas confirmou a cirurgia.

Na volta do Rio, resolvi ir ver o mesmo médico de Salvador que tinha me atendido em 71. E para minha surpresa, ele não falou mais em ligamento, deu outro diagnóstico, me deixando ainda mais confusa. Portanto, eu tinha nas mãos 5 diagnósticos diferentes, mas não confiava de verdade em nenhum. Somente numa coisa todos concordavam: na necessidade da cirurgia. O que fazer?

Foi aí que entrou em ação uma tia minha que morava em Brasília. O filho dela tinha sido operado do joelho recentemente por um médico de lá e tinha se saído muito bem. Portanto, “por que não traz Lilian pra cá, pra fazer uma consulta a esse médico?” - propôs ela. Não pensamos duas vezes. Duas semanas depois, lá estava eu em Brasília, com uma mala enorme, olhando extasiada aquela cidade tão diferente. Era um domingo, dia 16 de abril de 1978. No dia seguinte, às 9 da manhã, eu estaria frente a frente com mais um médico. E se ele desse outro diagnóstico?

Às 9 em ponto, entrei no consultório, com o coração apertado. Lembro bem do longo caminho que tive que percorrer da porta até a mesa dele. E sentado atrás daquela mesa enorme, lá estava ele, sorrindo para mim. Imediatamente lembrei do meu médico da televisão e disse pra mim mesma: “É ele, o melhor médico do mundo”!

Chamava-se Aloysio Campos da Paz Júnior e descendia de uma família toda de médicos. Sonhava em ser músico, mas o pai o obrigou a ser médico, como os irmãos e tios. Ele obedeceu, tornou-se um grande ortopedista e diretor-fundador do Hospital Sarah Kubitscheck, um dos hospitais mais conceituados do país. Mas uma tarde por semana, Dr. Campos não atendia ninguém. Era a tarde sagrada dele, reservada para tocar seu instrumento e realizar o sonho que nunca pôde ser realizado plenamente.

Gostei dele assim que ele sorriu e me cumprimentou. E mais ainda quando ele ligou um pequeno gravador pra gravar toda a nossa consulta. Enquanto eu ia descrevendo as façanhas mirabolantes da “minha bolinha”, ele “traduzia” minha história para o gravador, usando um vocabulário específico de medicina e já prevendo um possível diagnóstico. Fiquei fascinada com aquela tecnologia! Foi graças a ele que fiquei sabendo, finalmente, o nome da minha doença: “osteocondrite dissecante” e condromalácia da rótula”! Um nome pomposo, sem dúvida, que eu nunca mais esqueci! Este nome pomposo me fez enfrentar uma longa cirurgia, 28 dias numa cama de hospital, 3 meses de muletas e 7 meses de fisioterapia diária.

36 anos se passaram depois disso. Desse tempo, ainda tenho comigo um pedacinho da minha bolinha que eu pedi pra guardar de lembrança, e os 18 pontos que ganhei no joelho. Mas nada é mais marcante para mim do que aquele primeiro sorriso que ganhei dele. Um sorriso que me tirou todas as dúvidas e me encheu de coragem. Somente “os melhores médicos do mundo” conseguem isso. Como por exemplo, ele: Dr. Campos da Paz.

(A Dr. Aloysio Campos da Paz Júnior, “o meu melhor médico do mundo”, com todo o meu carinho e a minha gratidão - 27.1.15)


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