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O AMOR É LINDO...

  • Foto do escritor: Lilian Rocha
    Lilian Rocha
  • 17 de nov. de 2017
  • 4 min de leitura

Sempre achei engraçadas essas demonstrações de amor que por vezes beiram o ridículo, de tão inusitadas que são. Tem gente que escala montanhas, salta de paraquedas, contrata banda de música, tudo isso só para dizer um ‘eu te amo’ de um jeito diferente.

A verdade é que todo mundo que já esteve apaixonado um dia, também já enfrentou algum tipo de ‘sacrifício’, só para demonstrar o seu amor e não fazer feio diante da pessoa amada... Eu tinha apenas 14 anos e era a pessoa mais envergonhada do mundo quando enfrentei meu primeiro sacrifício. Tinha sido convidada pra jantar na casa do meu primeiro namorado e agora estava ali, disposta a enfrentar tudo! Até mesmo uma sopa de verduras... - Quer um pouquinho de sopa? – perguntou a mãe dele, muito gentil. Balancei a cabeça, enquanto 7 pares de olhos me observavam, esperando apenas que eu aceitasse, para que o jantar pudesse ter início.

Acontece que verdura nunca foi meu forte. Desde criança, sempre ofereci resistência àqueles pedaços grandes de cenoura, chuchu e batata boiando no prato e, por isso, o único jeito que restava à minha mãe era passar tudo no liquidificador. Só que naquela noite era diferente. Eu estava sozinha, diante daqueles pedaços ameaçadores de verdura e o que era pior, sem liquidificador nenhum por perto! Mas eu não podia fazer feio! Por isso, enchi minha colher com bastante caldo, respirei fundo e engoli aqueles pedaços de verdura como se fossem comprimidos. Sem mastigar! E enquanto a sopa ia lentamente desaparecendo do meu prato, meu estômago começava a embrulhar, dando mostras de que não aguentava nem mais uma colher... – Gostou? Quer mais um pouquinho? – tornou a perguntar a mãe dele. Dei um sorriso sem graça e rezei para que aquele jantar acabasse depressa. Nem me lembro o que foi servido em seguida nem o que aconteceu depois. Mas daquela “sopa de comprimidos’ eu nunca mais me esqueci.

Anos depois, eu haveria de passar por outra “prova de amor gastronômica”... Estávamos num restaurante elegante e meu novo namorado queria que eu experimentasse um ‘consomê’, ou seja, um caldo de carne, servido como entrada, antes do prato principal. Até aí tudo bem. Ele só havia omitido de mim um único detalhe que eu só percebi quando vi o garçon quebrar um ovo cru e jogá-lo dentro do caldo fumegante, sem que eu tivesse tempo sequer de reagir. E agora? Era tudo ou nada, pensei. Ou um ovo cru ou um namoro recém-começado... Novamente optei pelo namoro. Prendi a respiração e engoli o caldo, com aquele sorriso amarelo de quem não pode fazer feio diante da pessoa amada...

Mas nada se comparou àquela minha terceira ‘prova de amor’, decididamente a mais difícil... Ele tinha sido campeão de kart, acalentava o sonho de ser piloto de avião e, àquela altura da vida, estava completamente apaixonado pelo seu mais novo hobby: um ‘laser’. E ansioso para me mostrar suas habilidades, me fez logo o convite: “Topa velejar comigo?”

Novamente me vi numa sinuca. Completamente avessa a todo tipo de esporte, não conseguia nem me imaginar numa cena daquelas. Mas ele não precisava saber disso! Porque quando a gente está apaixonada, vale tudo! Até se fingir de corajosa...

E foi isso o que fiz. Me aprontei toda, como se velejar fizesse parte dos meus hábitos corriqueiros, e me deixei levar por ele até o Iate Clube, onde o barco ficava guardado. Lá no barracão, ele foi me apresentando a várias lanchas, dizendo o nome dos seus proprietários e contando suas histórias, com uma intimidade de quem conhecia bem aquele ‘universo náutico’, até então desconhecido pra mim. De repente, ele parou diante de um pequeno barco e disse, orgulhoso: “É este.”

Olhei o barco sem acreditar. Eu não tinha a menor noção do que significava um “laser” e estava imaginando uma lancha, toda potente. Mas quando vi aquele barquinho a vela, pensei, apavorada: “Quer dizer que um ‘laser’ é um barco a vela e eu vou ter que andar nisso aí?” Aquilo era pior do que todas as sopas de verduras do mundo!

Assim que subi, o barco pendeu para um lado e eu tive que me segurar fortemente no mastro pra não cair. Foram as duas horas mais longas da minha vida. Quanto mais ele explicava que eu devia ficar do lado contrário dele para manter o equilíbrio do barco, mais nervosa eu ficava e corria para perto dele, pois quando vinha o vento, o barco virava todo para o lado, dando a sensação de que ia virar, com vela e tudo. Vendo que eu não entendia nada do assunto, ele teve que assumir sozinho o controle do barco, trocando de posição a todo momento e, ainda por cima, tendo que me segurar várias vezes para eu não cair na água.

Quando o ‘passeio’ terminou – se é que eu posso chamar aquilo de ‘passeio’ - estávamos ambos encharcados e cansados de tanto fazer força. Mas ele parecia feliz e certo de que tinha encontrado uma companheira de aventuras e por isso me convidou para almoçar na antiga ‘Adega do Antônio' (onde hoje funciona o ‘Sushi Mori’), a título de comemoração. Assim que nos sentamos, ele me perguntou: “E aí, gostou? Quando é que a gente repete?”

Lembrei de todas as sopas e ovos crus que fui obrigada a engolir, ‘por amor’, e resolvi, dessa vez, seguir meu coração: “Nunca mais! Foi horrível, morri de medo!” Acho que ele gostou de minha sinceridade, pois dois meses depois estávamos casados. E nesses 30 anos de vida em comum, nunca mais tive que comer verduras nem andar de laser... É, o amor é lindo mesmo, mas pode ser melhor ainda quando a gente diz a verdade... (Lilian Rocha - 18.06.14)


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