top of page

O REENCONTRO

  • Foto do escritor: Lilian Rocha
    Lilian Rocha
  • 17 de nov. de 2017
  • 3 min de leitura

Há pessoas que surgem em nossa vida, dispostas a não “passarem”, simplesmente, mas a permanecerem para sempre. E mesmo sendo muito raros os nossos encontros, sempre são muito intensos. Há uma cumplicidade muda em nossos olhares, pois sabemos que estivemos juntos, num dos capítulos mais importantes da história das nossas vidas...

Quase 16 anos se passaram, mas sou capaz de reconstituir cada minuto daquele longo e difícil ano em que os tive como alunos. Lembro-me do lugar onde eles se sentavam, do jeito como me olhavam, da maneira como me respondiam e, principalmente, da minha total impotência diante deles. Eles não sabem, mas por várias vezes senti vontade de abandonar tudo: a escola, os alunos, minha profissão. Mas abandonar tudo seria o mesmo que “desistir” deles. E um professor “de verdade” jamais deve desistir de seus alunos. Isso seria o mesmo que deixá-los à deriva, sem rumo, sem alguém para conduzi-los...

Era nisso que eu acreditava, era assim que eu encarava a minha profissão. Se Deus tinha me confiado aqueles alunos, alguma razão Ele tinha, alguma coisa Ele também estava querendo me ensinar. Portanto, eu não podia nem iria desistir deles.

É exatamente neste momento, quando a gente “aceita” a vontade de Deus, que todo fardo se torna mais leve e tudo começa a mudar...

Descobri, então, que se eu não podia mudar aquela situação, podia, pelo menos, mudar a minha maneira de encarar aquela situação. Por isso, em vez de ficar angustiada, tentando descobrir por que eles não gostavam de mim, passei a amá-los “de longe”, respeitando-lhes o jeito de ser e, principalmente, a distância que eles queriam ter de mim. Nunca mais cheguei perto, nunca mais cobrei-lhes atenção. Mas continuei ali, presente e atenta, para o que desse e viesse. E eles entenderam isso.

E foi assim que chegamos ao fim do ano. Em silêncio e em paz. Mas dentro de mim eu queria mais, muito mais. Queria romper o silêncio, queria desejar-lhes felicidade para os próximos anos, queria a certeza de que eles não me queriam mal.

Mas nossa despedida foi bem diferente do que eu havia planejado. Um deles me procurou no final do ano e, meio sem graça, murmurou um pedido de desculpas. Dei-lhe um abraço de despedida e depois, em silêncio, vi-o desaparecer do corredor e logo depois, da minha vida. Senti uma tristeza imensa, pois intimamente eu sabia que ele estava indo em direção a um caminho escuro e tortuoso, do qual poucos conseguem voltar. E eu nada pude fazer para impedi-lo...

Da outra aluna, eu nem tive tempo de me despedir, pois um grave problema de saúde obrigou-a a deixar a escola pouco antes do fim do ano. Também senti uma tristeza imensa por não ter tido tempo de lhe dar o abraço que eu desejava.

Um mês depois, ei-la de volta pelos corredores do colégio, sem os belos cabelos de antes, mas com o mesmo sorriso de sempre. E diante daquela menina de apenas 17 anos, que parecia não ter medo de nada, eu finalmente entendi por que Deus me tinha emprestado ela. Para que ela me ensinasse a ser forte e nunca mais sequer pensasse em desistir de alguma coisa. Ganhei dela o abraço que eu tanto queria e a certeza de sua amizade.

Tive que esperar mais quatro anos para ter de volta o outro abraço daquele que parecia ter se perdido para sempre. Um abraço que veio primeiro em forma de "bilhete" e que depois se materializou num abraço de verdade, longo e prolongado, daqueles que calam todas as mágoas, todas as saudades... Choramos juntos naquele dia. Ele, por tudo o que havia passado; eu, por tudo o que não havia conseguido impedir...

Quase 16 anos depois, e eis que a vida nos coloca juntos outra vez, eu e meus dois alunos, Chico e Ana Terra, numa festa de celebração à vida. Vendo-os hoje assim, adultos, felizes e donos de suas próprias famílias, só tenho a agradecer a Deus por não ter me permitido “desistir” deles. Pois foi através deles que aprendi que toda forma de amor vale a pena e é capaz de transformar tudo. Mesmo que às vezes, esse amor tenha que ser só “de longe”...

(Lilian Rocha - 25.5.15)


Comments


RECENT POSTS
SEARCH BY TAGS
ARCHIVE
bottom of page