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O TRIÂNGULO DAS TAMPAS

  • Foto do escritor: Lilian Rocha
    Lilian Rocha
  • 17 de nov. de 2017
  • 4 min de leitura

Se tem uma coisa que sempre me intrigou foi o famoso Triângulo das Bermudas, aquela região do Oceano Atlântico onde subitamente tudo desaparece sem deixar vestígios: barcos, navios, aviões... E mais impressionante ainda são as embarcações que desaparecem repentinamente e dias depois reaparecem intactas, mas sem a tripulação. As explicações que se dão a isso são as mais diversas e algumas até estapafúrdias: OVNis, sequestradores, animais submarinos gigantescos, vulcões submarinos em erupção, piratas e até bolhas de gás metano que se elevam e engolem tudo ao redor. Embora a hipótese do gás metano seja a mais plausível, até hoje nada foi totalmente comprovado.

Mas quem pensa que esse fenômeno misterioso só acontece no Triângulo das Bermudas, eu posso garantir que existe um outro ‘triângulo’ dentro da minha cozinha, mais precisamente delimitado por uma linha imaginária entre a pia, o escorredor de pratos e o armário de cozinha. É exatamente aí que todas as minhas vasilhas plásticas perdem as tampas. E não são só as tampas, muitas vezes é a ‘embarcação inteira’ que desaparece, ou seja, vasilha e tampa são engolidos subitamente, sem deixar vestígios. O fenômeno é tão impressionante que por vezes ele ultrapassa os limites da cozinha e chega até a área de serviço, engolindo uma dezena de pés de meia e deixando a outra dezena para sempre solitária e imprestável...

Intrigada com esse fenômeno paranormal, há anos que tento manter o controle da situação, mas em vão. Sempre que vou ao supermercado, por exemplo, compro um kit novo de vasilhas plásticas, acompanhando, claro, a ‘tendência’ do momento, pois a cada estação do ano, os fabricantes de vasilhas criam novos modelos, cores e tamanhos que deixam qualquer dona de casa doida de felicidade. Tenho (ou melhor, tinha!) vasilhas redondas, retangulares, coloridas, transparentes e estou sempre atenta para os novos modelos que surgem, pois não quero jamais que meus restos de comida fiquem guardados em vasilhas fora da moda, Deus me livre!

Além disso, costumo aproveitar também as embalagens vazias de manteiga, queijo e sorvete, para saciar a fome insaciável deste extraterrestre que habita o meu ‘Triângulo das tampas’, pois nunca se sabe quando ele vai atacar novamente.

Domingo passado, passei a tarde na cozinha, investigando esse fenômeno, pra ver se tentava descobrir o que acontecia exatamente no momento em que a vasilha sai da geladeira. Primeiro, tratei de arrumar o armário de cozinha onde moram todas as minhas vasilhas e qual não foi minha surpresa quando vi a devastação: encontrei 7 tampas para apenas um pote de sorvete, 4 vasilhas sem tampa, 5 tampas sem vasilha e todos os ex-potes de manteiga intactos, com todas as suas tampas! Descoberta interessante: meu OVNi não é muito fã de potes de manteiga, ele demonstra ter um gosto mais requintado...

Em seguida, reconstituí todos os passos do que seriam os últimos momentos de um casamento feliz entre uma vasilha e sua tampa: peguei uma vasilha verde que estava na geladeira com sobras de arroz, despejei o arroz na panela para esquentar e deixei a vasilha com a tampa na pia. Descobri que é impossível alguém desocupar o conteúdo da vasilha sem abrir a tampa. Infelizmente! Mas descobri também que é muito improvável alguém tirar uma vasilha da geladeira e deixar a tampa lá dentro. Portanto, a possibilidade de essa vasilha chegar com a tampa na pia é muito maior, o que comprova a hipótese de que as tampas não desaparecem dentro da geladeira.

Satisfeita com essa descoberta, passei para a terceira parte do meu processo de investigação: a lavagem da vasilha! Peguei a vasilha e, com muito cuidado, comecei a lavá-la, mas sem tirar os olhos da tampa que me aguardava em cima da pia. Em seguida, coloquei a vasilha no escorredor e peguei a tampa. Nesse momento, fiz outra descoberta importante: enquanto a gente lava a vasilha, a tampa não sai correndo; ela permanece quietinha, esperando a vez de ser lavada. Portanto, também não é no momento da lavagem que o fenômeno acontece.

Assim que lavei a tampa, coloquei-a no escorredor, perto da vasilha, que já tinha sido lavada. E fiquei observando o que acontecia. Se a tampa corria pra perto da vasilha ou se alguma força misteriosa atrairia a tampa ou a vasilha para dentro do ralo da pia. Nada. Depois examinei o gás, pois se o gás metano faz desaparecer navios e aviões gigantescos, quem sabe o gás ‘butano’ não seria capaz de uma façanha semelhante? Mas também não havia vazamento de gás.

Enxuguei a vasilha, depois enxuguei a tampa e coloquei ambas bem juntinhas dentro do armário e esperei pra ver se alguma anomalia no campo eletromagnético do planeta Terra ia ser capaz de engolir aquela tampa e deixar o armário intacto. Mas nada aconteceu, claro, pois nenhum fenômeno que se preza vai agir na frente de alguém. Ele vai esperar, primeiro, que a gente se retire da cozinha.

E foi o que fiz. Saí da cozinha de costas, de olho pregado no armário, atenta a qualquer ruído suspeito e entrei no meu quarto exausta, emocionalmente. Meu marido me olhou, espantado, e depois que eu expliquei, ele disse que era bobagem, que nenhuma tampa some assim e que tudo não passava de imaginação minha.

Mas no dia seguinte, à noite, encontrei minha vasilha verde novamente dentro da geladeira, dessa vez com um restinho de carne. E sobre ela, uma tampa vermelha, muito maior do que ela...

(Lilian Rocha)


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